De que é feito um time?
Pessoas são seres sociais, e as interações entre elas são o centro do desenvolvimento Ágil. Para construir software tendemos a nos organizar em grupos que costumamos chamar de times. É um nome bacana que traz sentimentos de colaboração e motivação, mas será que todos os grupos de pessoas são de fato times?
Nós costumamos pensar que o que diferencia grupos de times é a presença de um objetivo compartilhado que guia as ações das pessoas. Se várias pessoas se reúnem em busca de um mesmo objetivo, elas formam um time. Isso é verdade, mas não é tudo. No fim das contas, o que transforma um grupo de pessoas em um time é a interdependência. Um grupo de representantes de vendas trabalhando para a mesma empresa compartilha o objetivo de vender os produtos de seu catálogo, mas ao mesmo tempo cada pessoa busca vender mais do que os outros para ganhar um bônus. Isto não é um time. Um grupo de jogadores de beisebol, por outro lado, é um time não só porque compartilha o objetivo de vencer; os jogadores também dependem uns dos outros. O terceira base não pode vencer o jogo a não ser que o arremessador e o catcher façam um bom trabalho na defesa. Quando pessoas dependem umas das outras elas são um time.
Este é o grande segredo: o que torna um time interdependente são as relações interpessoais que existem dentro dele. É possível também dizer que a qualidade das relações interpessoais de um time é uma das coisas mais importantes com as quais um líder deveria se preocupar. Então, como podemos entender estas relações?
Como sempre, é muito difícil enxergar entidades subjetivas, como relacionamentos interpessoais, com um olhar analítico. Isto não significa que não podemos pelo menos tentar. Vamos imaginar um time de quatro desenvolvedores trabalhando em um projeto: Alice, Bob, Carol e Dave. Usando matemática simples podemos ver que, apesar do time ter quatro pessoas, ele é na verdade formado por seis relações interpessoais (Alice<->Bob, Alice<->Carol, Alice<->Dave, Bob<->Carol, Bob<->Dave, Carol<->Dave).
Suponha que podemos observar a maneira como estas pessoas interagem entre si; nós escutamos o que eles falam enquanto estão pareando, prestamos atenção em como eles se referem um ao outro durante reuniões do time, etc. Depois de algumas semanas, esse é o resumo do que observamos:
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Alice e Dave se dão muito bem; quando trabalham juntos em uma estória eles tendem a entregar mais rápido do que quando trabalham com outras pessoas; eles também parecem confiar muito um no outro.
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Bob é uma pessoa muito amigável; todos gostam de trabalhar com ele e todos confiam em suas opiniões.
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Carol parece não confiar completamente em Alice. Elas conseguem trabalhar juntas, mas Carol costuma questionar as decisões da Alice com certa frequência.
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Dave não se dá muito bem com Carol. Talvez ele não goste do fato de que a Carol não confia nas opiniões da Alice. Ele discute com a Carol o tempo todo e não parece confortável quando ambos trabalham juntos.
A partir disso chegamos à conclusão de que, embora a maior parte das relações do time pareça saudável, existe um certo nível de atrito e desconfiança entre pessoas específicas. Mas como está a saúde do time como um todo? Vamos tentar uma visualização:
Os quadrados verdes representam relações saudáveis. O amarelo representa uma relação onde há alguma desconfiança, mas que ainda funciona. O vermelho representa uma relação quebrada: as pessoas não conseguem trabalhar bem juntas.
A maioria das relações está "verde". Há algum ruído, mas em termos gerais parece que o time está OK. Afinal de contas, é normal existir um pouquinho de atrito entre pessoas de um time, certo?
Mas vamos olhar novamente: imagine que os quadrados verdes contam como relações completamente saudáveis, enquanto o amarelo conta como neutro (zero) e o vermelho conta como uma relação negativa que está prejudicando o time (logo, subtraindo do total de relações). Algo como isto:
Vamos somar os números novamente: no fim das contas há somente três relações pessoais de qualidade. Isso pode significar que nosso time tem apenas 50% da eficiência que poderia ter. Será que ainda podemos assumir que, em termos de relacionamentos, o time está "OK"? Se um time é um conjunto de indivíduos (e seus relacionamentos) que dependem uns dos outros para obter sucesso, uma relação interpessoal danificada prejudica não só os dois lados da ligação, mas todas as outras pessoas também. Em um time altamente funcional, qualquer instância não tratada de desconfiança vai se alastrar como um incêndio, destruindo a coesão do time e prejudicando sua efetividade.
É claro que isso tudo é uma representação grosseira de coisas muito mais importantes do que números e cores. Certamente deixa de fora as nuances das pessoas reais e de suas interações. Mesmo assim, o ponto central ainda parece válido: problemas aparentemente pequenos nas relações de um time podem custar mais do que imaginamos. Como participantes e líderes de times altamente efetivos que entregam resultados fantásticos, cuidar das pessoas e de como elas interagem, provendo os meios necessários para que elas cresçam e se desenvolvam como agentes sociais deve ser uma preocupação constante que permeia tudo o que fazemos.
O que fazer?
Como um líder, invista seu tempo em conversar com seu time. Compreenda as pessoas como indivíduos. Retrospectivas e outras cerimônias podem ajudar, mas nada supera comunicação face-a-face aliada a interesse genuíno e empatia. Escute mais, fale menos, respeite as opiniões das pessoas e não trate nenhuma preocupação como insignificante. Quando você se tornar competente em alguma coisa, delegue para outra pessoa e participe de seu crescimento. Entenda a cultura do seu time e ajude a moldá-la. Incentive a comunicação em todos os níveis, em todas as direções, o tempo todo. Compartilhe o contexto e construa consenso. Tudo isso é bastante trabalho e uma grande responsabilidade mas, afinal, não são as pessoas e suas interações o que há de mais valioso no Ágil?
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